Post do arquivo do Café com Blá Blá Blá*
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Em 2018 nós perdemos todos os posts antigos e, aos poucos, estamos subindo o conteúdo antigo para que todos tenham acesso.
Comecei a admirar a escrita espirituosa e contagiante de Charles Dickens há muito tempo, depois de namorar os volumes antigos que habitavam a biblioteca pessoal do meu avô – e que, posteriormente, seriam adicionados a minha própria coleção.
O tempo passou e, anos depois, voltei a me encontrar com ele através das páginas já amareladas de um exemplar de Um conto de duas cidades alugado na biblioteca da faculdade. Porém, essa “fixação” só veio mesmo no começo do ano passado, após me deparar “por acaso” com o livro A moça do vestido azul, da Gaynor Arnold, um romance que tinha como base a vida e o casamento de Dickens.
A partir de então, passei a colecionar seus volumes e a pesquisar mais profundamente sobre sua vida e obra. Optei por seguir seus passos (e textos) cronologicamente e, assim, resolvi começar a minha jornada através da leitura paralela de dois livros: Retratos Londrinos e As Aventuras do Sr. Pickwick.
Muitos meses, semanas e dias se passaram… E finalmente concluí a leitura da edição nacional do icônico Sketches by Boz – e não foi pelo fato de o livro ser lento ou maçante (o que ele não é!), mas sim pela demanda de outras leituras, que acabaram por atravancar o meu avanço.
Retratos Londrinos é uma coletânea de contos e crônicas publicados por Charles Dickens durante o período que este trabalhou como repórter e redator para alguns jornais londrinos.
Porém, apesar de trazer textos curtos, o livro já apresenta características que consagrariam o autor: uma narrativa fluida e rica em detalhes, protagonizada por personagens carismáticos e inesquecíveis. Na voz de T. S. Elliot (parafraseada pelo organizador do livro, Marcello Rollemberg): “Com uma simples frase, [Dickens]podia fazer de um personagem um ser real, de carne e osso”.
E é exatamente isso que podemos constatar logo nas primeiras páginas desta obra. Dividido em 3 partes – Cinco retratos da nossa paróquia, Cenas e Personagens – o livro retrata cenas cotidianas da realidade inglesa com tamanha minúcia, que é quase como se estivéssemos ali com o autor, percorrendo as ruas da Londres de 1830.
Com um humor característico (ácido até), a narrativa esmiúça os caráteres mais oblíquos, as ações mais absurdas e as situações mais cômicas do período, levando-nos dos risos aos… risos de uma só vez.
Destaco aqui dois dos textos que mais me arrebataram: “Sobre lojas e lojistas”, que narra as mudanças de um ponto comercial na cidade e as diversas tentativas dos lojistas de conseguirem estabelecer os seus negócios (e que, não por acaso me lembra do também excelente “Reflexões em Mounmouth Street”, que descreve o passar do tempo e dos costumes através da observação das roupas expostas na vitrine de uma loja); e “O amanhecer nas ruas”, que nos transmite com maestria o despertar de uma grande metrópole – desde o clima bucólico dos primeiros raios de sol, até o fuxico (e o flerte) das criadas à porta de suas residências.
Vale ressaltar que, apesar de trazer as crônicas na íntegra, o livro não apresenta todos os trabalhos reunidos na obra origina: Sketches by Boz*. Marcello Rollemberg explica logo no início deste volume os critérios que adotou para ocultar um outro trabalho (alguns, segundo ele, não condizem em absoluto com a nossa realidade brasileira e não fariam “sentido” em uma edição nacional. Outros, soaram um tanto repetitivos, por tratarem de assuntos abordados em outro texto). Longe de mim julgar a opção do organizador… Pelo contrário! Gostei bastante da seleção e fiquei ávida por ler mais alguns deles.
Fazendo um balanço geral? Acredito que Retratos Londrinos seja uma ótima forma de conhecer o autor, uma vez que possui várias de suas facetas como narrador. Agora, se você já teve contato com a sua obra através de outro livro, poderá conhecer um outro lado da engenhosidade de Dickens. Sem dúvida, um must read!
E quando ao progresso do Projeto… Fiquem ligados para novas atualizações aqui no Café!
*Boz é um pseudônimo com o qual Dickens assinava suas reportagens. No começo de sua carreira, o “apelido” era mais popular do que o seu nome verdadeiro.
Ficha Técnica:
Título: Retratos londrinos
Autor: Charles Dickens
Editora: Record
Páginas: 302
País: Inglaterra
Avaliação: 5/5 estrelas