Post do arquivo do Café com Blá Blá Blá*
Este post faz parte do arquivo do blog.
Em 2018 nós perdemos todos os posts antigos e, aos poucos, estamos subindo o conteúdo antigo para que todos tenham acesso.
Depois de um longo e caloroso verão, estou de volta com mais um “update” no meu desafio do Projeto Dickens!
Tendo “furado” uma vez a cronologia da obra do autor com a leitura de Um conto de Natal, acabei aproveitando para passar na frente um dos livros mais consagrados do Charles Dickens (e que é também o próximo livro do meu clube de leitura): Grandes Esperanças!
Confesso que muito do meu entusiasmo com a obra veio após assistir ao trailer da sua nova adaptação cinematográfica, que traz nomes como Helena Bonham Carter e Jeremy Irvine. Por isso, quando definimos no clube de leitura que o critério de escolha para a nova rodada de leituras seria livros e seus respectivos filmes, corri para sugeri-lo.
E, gente, cá entre nós: como não apaixonar pela história de Pip?
Comentei em outro post sobre a dificuldade que vinha enfrentando para encarar a leitura de “tijolões”. Há muito tempo que não me propunha a desbravar um livro com mais de 500 páginas, mas decidi que por Grandes Esperanças valia a tentativa. E que delícia que foi!
“Para e pensas, tu que me lês, por um momento, na longa cadeia de ferro ou ouro, de espinhos ou flores, que jamais te teria cingido, não fosse a formação do primeiro elo num dia memorável”.
O livro é narrado por Philip Pirrip – ou, como é conhecido por todos (e por ele mesmo), Pip. Assim como grande parte da obra de Charles Dickens, começamos a acompanhar o personagem no início de sua vida, quando, ainda criança, morava com a irmã (bem mais velha) e com o cunhado, o bondoso ferreiro Joe.
Logo no começo da narrativa, a vida pacata de Pip sofre uma reviravolta quando, em uma de suas andanças pelo charco próximo a sua casa, o garoto se depara com um preso fugitivo. Aterrorizado por aquele estranho homem, Pip resolve levar uma porção de comida para ele – o que lhe gera uma grande culpa pelo fato de ter roubado aqueles alimentos da casa da irmã.
O tempo passa, o prisioneiro é recapturado, e Pip tem uma nova surpresa ao ser convidado para frequentar a casa de uma rica senhora que mora perto dali. E é aqui que temos o surgimento de uma personagem fantástica e muito peculiar: a Sra. Havisham. É admirável a habilidade que Dickens possui de inserir elementos estranhos e um tanto misteriosos em suas narrativas, de forma que eles sejam incorporados de tal forma à história que se tornam quase que naturais – e não as aberrações que a princípio possamos ter pensado.
A Sra. Havisham é uma mulher que literalmente parou no tempo, após sofrer um grande sofrimento. Com suas atitudes estranhas e sua forma peculiar de viver a vida, ela acaba atraindo curiosidade, admiração e até uma certa repulsa por parte de Pip. Porém, dentro de sua casa em ruínas, ela esconde o grande tesouro do coração do menino: Estella, uma menina muito linda – e igualmente fria.
“É importante que saibas que não tenho coração”.
O contato com Estella leva o menino a questionar, pela primeira vez, a sua posição inferior na sociedade e gera um grande conflito em sua consciência. Esse é apenas o início de um conflito que permearia toda a narrativa: o desejo vs. a culpa. Ao mesmo tempo em que Pip quer ser mais, ele se culpa por não se satisfazer com o pouco que tem (ainda mais pelo fato de Joe tratá-lo como um filho e procurar sempre dar o melhor a ele).
Avançando mais na história, somos surpreendidos com a notícia de que Pip é o objeto de “grandes esperanças”, quando um misterioso patrocinador resolve investir na formação do garoto como um cavalheiro. O menino herda uma propriedade e se muda para Londres para aprender como se tornar um homem respeitável frente a sociedade e a partir daí novos conflitos se desenrolam.
Apesar de não ser dito em palavras, ao longo da leitura percebemos que a narração é feita por um Pip mais velho, que olha para o seu passado e discorre sobre os fatos mais marcantes de sua vida – e os sentimentos atrelados a eles. Ele é até um tanto condescendente com as impetuosidades de seu “eu” mais jovem e em nenhum momento tenta justificar suas ações naquele período – apenas apresenta seus conflitos internos e dúvidas que atormentavam o seu espírito.
Acredito que a palavra que melhor define esse livro é redenção. Ao longo de toda a história, os personagens cometem muitos erros, insistem em episódios já passados e sofrem com as consequências de seus atos. Porém, depois de tanto serem malhados por esses erros, todos acabam se redimindo por eles.
Pode parecer um exagero, mas acredito que a principal mensagem que Dickens tenta passar é a de que nada está inscrito em pedra. Sim, como seres humanos somos passíveis de falhas, mas sempre podemos aprender com elas e nos tornarem pessoas melhores.
Sei que soa piegas, mas isso é representado de forma tão tocante nas histórias cruzadas desses personagens, que é impossível não nos emocionarmos com elas.
Outro aspecto muito forte na obra é a amizade. Pip tem a sorte de ter amigos muito fiéis que acompanham e apoiam de olhos fechados todas as suas ações (mesmo as mais estúpidas). E, mais tarde, o próprio personagem tem a chance de também se provar como um amigo fiel e companheiro. Essa sua transformação é uma das coisas mais lindas do livro e confesso que me tirou algumas lágrimas sorrateiras.
Phew! Sinto que poderia passar dias debatendo sobre todos os elementos dessa obra riquíssima, mas já penso que estou me estendendo de mais para um único post (parabéns se você chegou até aqui!). A única coisa que posso dizer, é que espero que tenha despertado pelo menos uma pequena vontade em você de ler este livro. Ele é daqueles que você tem vontade de sair distribuindo pelas ruas dizendo: “por favor, leia! Você não vai se arrepender!”.
Alguma dúvida que já entrou para os favoritos da vida?
Ficha Técnica:
Título: Grandes Esperanças (Great Expetactions)
Autor: Charles Dickens
Editora: Penguin Companhia
Páginas: 704
País: Inglaterra
Avaliação: 5/5 estrelas